Durante o mês de setembro, quando a atenção à saúde mental ganha ainda mais relevância, a Universidade Católica de Pelotas (UCPel) destaca um projeto que vem se dedicando a compreender e melhorar o bem-estar psicológico de um grupo mais vulnerável: mulheres em trabalho de parto ou no período imediato ao nascimento de seus bebês.
Coordenada pelo médico e professor Marcos Razera, a pesquisa é desenvolvida pelo curso de Medicina da UCPel em parceria com o Hospital Universitário São Francisco de Paula (HUSFP), e vem sendo executada desde 2023. A iniciativa analisa dados coletados durante o atendimento às gestantes com o objetivo de avaliar sua saúde mental e promover melhorias no cuidado assistencial.
“A iniciativa surgiu da percepção de que muitas informações valiosas coletadas durante os atendimentos acabavam sem o devido aproveitamento. A partir dessa constatação, aliada ao desejo de aprimorar o cuidado aos pacientes e estimular o interesse científico entre os estudantes de Medicina, nasceu o projeto de pesquisa”, destaca o professor Marcos Razera.
A pesquisa
A pesquisa abordou 782 mães, entre outubro de 2023 e junho de 2025 e que foram atendidas no HUSFP. Dentre as 738 com dados completos, 60,3% relataram que a gestação não foi planejada. A pesquisa revelou que sintomas de ansiedade e/ou depressão durante a gestação foram relativamente frequentes: 43,9% das participantes apresentaram algum sinal de sofrimento emocional.
Ao cruzar os dados com o planejamento da gestação, observou-se que 48,1% das mulheres que não haviam planejado a gravidez relataram sintomas, enquanto entre aquelas com gestações planejadas o índice foi de 37,5%, indicando uma associação importante entre o planejamento gestacional e a saúde mental materna.
O coordenador indica que, a partir da constatação de sofrimento emocional, seja leve ou mais severo, solicita-se a avaliação da paciente com profissionais especializados: psicólogos e/ou psiquiatras.
Caminho para a ciência
Valéria Fagundes, estudante de Medicina da UCPel e psicóloga, entende a importância do estudo: “o cuidado com a saúde mental da parturiente muitas vezes não recebe a mesma atenção que os aspectos biológicos e obstétricos. Aprendemos com frequência a avaliar sinais vitais, exames laboratoriais e a evolução clínica do parto, mas nem sempre somos treinados a reconhecer sinais de ansiedade, depressão ou sofrimento psíquico”
Para a acadêmica, que integra a pesquisa desde a sua concepção, todo o cuidado com a parturiente é importante para que o bebê se desenvolva de uma forma saudável: “ansiedade, depressão e outros transtornos psíquicos nesse período podem impactar não apenas a vivência da gravidez, mas também o desenvolvimento do bebê, a qualidade do vínculo mãe-filho e até mesmo os desfechos obstétricos. A saúde mental da mãe está, portanto, diretamente relacionada ao bem-estar do recém-nascido, ao estabelecimento do vínculo afetivo e à adesão aos cuidados pós-parto. Esse olhar também reforça a importância de uma atuação multiprofissional, na qual o acompanhamento obstétrico se articule com o suporte psicológico”, conclui Valéria.
Além de Valéria, outros seis estudantes participam do projeto. Uma delas é Nathalia Schick, que participa pela primeira vez de uma pesquisa acadêmica: “Participei ativamente da pesquisa por meio da coleta de dados específicos relacionados ao histórico clínico e social das gestantes. Eu pretendo seguir produzindo cientificamente. Acredito que a produção científica nos enriquece academicamente e nos permite contribuir ativamente para o avanço do conhecimento na nossa área de interesse, visualizando dados reais da nossa realidade”, ressaltou.
Professor e médico Marcos Razera e a estudante de Medicina Nathalia Schick em apresentação do trabalho no Salão Universitário da UCPel (arquivo pessoal)
Com os dados obtidos, a equipe busca promover, cada vez mais, a pesquisa acadêmica, aliando sempre a teoria à prática. “A pesquisa nos permite criar e elaborar inúmeros trabalhos a partir da análise de dados”, explicou Nathalia. A estudante explicou que, com a pesquisa, foram produzidos trabalhos para inúmeros eventos, como o Congresso Internacional de Especialidades em Pediatria/Criança 2025, que foi em Curitiba, e o Salão Universitário da UCPel. “Atualmente, estamos em fase de planejamento para a redação e submissão de artigos a periódicos científicos”, enfatizou.
Contribuição para a saúde pública
A iniciativa não só contribui para o avanço científico, mas também visa melhorar a qualidade do atendimento e o bem-estar das gestantes atendidas, reforçando a importância de um cuidado integral à saúde mental no contexto do nascimento de um novo ser humano.
“O estudo traz uma série de benefícios da todos os envolvidos: qualificou a coleta de dados no hospital, auxiliou na atualização de questionários de anamnese, gerou protocolos assistenciais, aprimorou o atendimento ao paciente internado, reforça a importância da produção cientifica no meio acadêmico, esclarece ao aluno a relevância de uma boa coleta de dados para assistência e pesquisa e enriquece o currículo dos envolvidos”, pontuou o professor Marcos Razera.
“Quando os acadêmicos se envolvem nesse processo desde a graduação, desenvolvem uma postura crítica, investigativa e socialmente comprometida, o que amplia o impacto da formação acadêmica na prática profissional futura”, finalizou a estudante Nathalia Schick.
Redação: Lucas Pereira